Artista do Piauí fica deprimido e cria obra de arte com fezes

 
Comecei essa coisa dia catorze de novembro. Sem pretensão de nada. Na verdade, tava cuidando de uma depressão que começou lá pros meados de julho. Na verdade mesmo começou em março, mas não tinha me dado conta.

Fiquei mais de dois meses sem quase sair de casa. Passava a maior parte do tempo no meu quarto, principalmente dormindo. Nesse tempo rolava uma coisa meio contraditória: ao mesmo tempo em que não queria ver ninguém, não suportava a ideia de ficar só… e tinha um lugar onde esse medo aumentava: o banheiro.

Fazia cocô e saia de lá correndo, com medo de mim, do cocô, sei lá, nem queria saber de olhar aquilo dali. Muitas vezes nem lembrava de dar descarga. O próximo pobre coitado da minha família que entrava no banheiro dava de cara com um fedor vomitante.

Ai comecei esse negócio de olhar, quase que enfrentar as fezes.

Fui olhando, fotografei um, dei descarga nele e fui editar, botei nome e tudo.

No dia seguinte fiz a mesma coisa, tudo com as fezes lá quietinho no vaso e, bom, aos poucos foi se tornando um hábito…

Não passava muito tempo na edição, nem pra dar nome.

Era ali.

Pá puf!

No sentimento do momento.

Esse exercício passou a ser meu “lady motive”, tipo um ponto de referência na linha dos meus dias que tinham 72 horas ao inves de 24.

Comecei a chamar esse diário de obsceno, sei lá porque.

Mas acho que porque obsceno é tipo um algo que sugere um outro algo que está escondido; e sugere de um jeito que dá vontade de ver o que tá escondido; as vezes você até sabe o que é esse algo escondido, mas ainda assim tu tem vontade de ver, pegar.

Fiz uma pesquisa sobre a a etimologia da palavra obsceno e esbarrei com o Freud dizendo:

“somos levados a supor que foi e ainda é necessário certo esforço para controlar nossos impulsos agressivos em direção aos outros seres humanos. O primeiro ato civilizatório teria ocorrido quando, em vez de responder ao impulso de eliminar fisicamente a alguém que o tenha desagradado, o ser humano pré-histórico xingou aquele outro.”

(Ai comecei a pensar que todas essas bostas, de algum jeito, poderiam ser xingamentos…)

Já alguns pensadores de atualidade falam que estamos vivendo num momento de relações “teflon”.

Teflon é um material muito usado pra fazer panelas, porque praticamente não reage com outras substâncias químicas e têm um baixíssimo coeficiente de atrito.

Eu entendo que esses pensadores querem dizer mais ou menos que tamo vivendo um momento onde as pessoas não se “misturam”, é como se essa mistura não provocasse uma combustão, alguma reação química que seja, ta todo mundo protegido um do outro. e como também não rola atrito não é possível se apegar muito a algo ou alguém. E ai a gente vai assim, deslizando sobre as coisas, as relações, tudo, sem aderir nem reagir.

No primeiro momento que ouvi isso do teflon achei um tanto pessimista, e também contraditório, se pensarmos que tamo vivendo num momento ondes as possibilidades e ferramentas pra se comunicar tão cada vez maiores, eficientes e complexas.

Num segundo momento pensei que pode ser bem gostoso aproveitar a adrenalina de ir deslizando por ai, veloz, devagarzinho, girando, de peito, de bunda, de trenzinho, tipo surfando … até esbarrar em alguém, ou numa outra teoria que desexplique essa.


Esse cocô editado tem uma morfologia do medo.

(Eu, me cagando de medo de viver além da porta do quarto)

Ao mesmo tempo vejo ele todo como um hosróscopo escatológico, que você olha e sabe mais ou menos o dia que teve ou que vai ter. Editado a partir de uma mitologia íntima.

Pensei também:

- bicha, que chic, um cu pintor?

(junto, é claro, do Microsoft Office Picture Manager, um editor simples)

Tem uma coisa mea natureza morta-viva.

Síntese da comida da Rosilda.

Assim, com um lirismo, super saturado, extrapolando a realidade da merda.

Cocô sabor flash!

Perdida no esgoto da cidade.

Agora, compartilho com vocês os cocôs!

… Do mais antigo pro mais recente.

Por - Elielson Pacheco

Fotos:


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